sexta-feira, 22 de abril de 2011

O galo miou


O GALO MIOU
Aroldo Martins
In O Potiguar Nº 50
Março/Abril 2008

Um poviléu pachorrento na pequena cidade silenciosa escuta pelos doze auto-­falantes espalhados pelo Grande ­Ponto e Ribeira o que se passa no começo da Segunda Guerra Mundial.

Notícias de invasão, desordem e destruição numa Europa guerreada.

Pasmados, os cidadãos circunstantes comentam os fatos acontecidos e logo após escutarem as badaladas do relógio Big-Bem ao final da transmissão, retomam seus costumeiros afazeres. 

São os tempos de Zé Areia, festejado príncipe dos chistes e do deboche instantâneo. Ginosofista, lança por terra, numa rapidez estonteante, aquele que o provoca, dando-lhe resposta fulminante.

O sujeito Genival vê de longe um pai-­de-chiqueiro a ser premiado numa rifa de Zé:
- Que bode feio, magro e fedorento, Areia! E parece que não é sério! Esse bicho tem nome?
- ­Genival, disse Zé.

Barbeiro filibostênico - o que tira sangue -, manejou uma velha Solingen que em tempos frios não pegava corte. E durante algum tempo manteve o ofício trabalhando num salão para os lados da Ribeira. Um tabaréu foi entrando e disse:

- Que catinga de inhaca nessa rua, Zé! E é de uma ponta a outra!

Areia, sem levantar os olhos:
- Veio tirar o bigode?

Zé a todos conhecia e com todos pilheriava na mais fina picardia nas mais diversas oportunidades e ocasiões. Bitáculas o atraem. Numa conversa, convida um amigo:

- Domingo vá sem falta. Tenho pinga de cabeça e vou fazer um galo torrado lá no meu barraco, perto do Miguel Couto.

E Nilson Patriota foi. Nas encostas do morro, se descobre a Praia do Meio, de poucas habitações. O lar de Zé Areia é recoberto de palhas de coqueiro e seu piso é na areia macia da própria duna, tapera humilde, mas de onde vem um cheiro bom de comida caseira em panela de barro.

Enquanto espera Zé, Nilson toma uns aperitivos com alguns pedaços do tira-gosto. Elogiando a comida, diz à mulher ter apreciado o tempero, a cor e o sabor do galo torrado.

- Galo? Questiona a mulher. Ele disse que era galo? Zé Areia não tem jeito, não. O senhor comeu gato, e, ao invés de ser um novinho, que fugiu logo cedo, ele arranjou um velho que ia passando aqui por perto. É gato torrado, seu Nilson.
Cardíaco, dizia:
 - Estou farto de ter infarto! Num último arfar, sussurrou, baixinho:

- Mulher feia, quero morrer em teus braços!

E lá se foi Zé Areia, virando areia que já se fez pó.

Nenhum comentário:

Postar um comentário