COM JOANILO, A MÚSICA POP, PAPO, ARCANJOS E POLÍTICOS
Texto: OSAIR VASCONCELOS
Misture-se Noel Rosa, Beethoven, Bach, Brahms, Pink Floyd, Pixinguinha, Bob Dylan, Raul Seixas, o som de John Lennon e o de Tom Jobim, Egberto Gismoti, Rick Wakeman, Eric Clapton, a política de Chico Buarque e Milton Nascimento; acrescente-se a poesia de Federico Garcia Lorca, Pablo Neruda, Rimbaud, as falas do Eclesiastes, a literatura latino-americana, o grito de liberdade e a "capacidade de ouvir trezento milhões de arcanjos em plena praia do Forte”. Derrame isto tudo como um buquê de canções “sobre o corpo desnudo da amada ausente”.
Isto é o caos? É o caos, mas no princípio, diz a Bíblia, havia o caos. O caos, diz Nietzche, é o principio de tudo, aquilo que leva à razão. Quando havia o caos em que se criou o universo, não havia primeiramente o Verbo. Havia a Música. o Som. O som que desaguou contemporaneamente na música de Frank Zappa, Jethro Tull, Emerson, Lake & Palmer, Jimmy Hendrix, Janis Joplin, Hermeto Pascoal, Vinicius de Morais, Gilberto Gil, Queen, Carole King, mas que nasceu muito antes, nas composições da Santíssima Trindade dos três Bs: Beethoven, Bach e Brahms.
E o homem que mistura tudo isso, por gozo à música, por sentir entrar no corpo e no espírito o que ela é, o homem que coleciona quatro mil discos, e os faz viver em dois tocadiscos, dois gravadores e dois amplificadores, misturados aos seus seis mil livros e à vontade de gritar liberdade, é Joanilo de Paula Rego, certamente um dos maiores, senão o principal curtidor da música POP, o som da contracultura, o rock.
Digo como Salvado r Dali: Amo o rock como amo tudo o que é dionisíaco violento e afrodisíaco.
NA MÚSICA, DEUS
O “Heiling Dankgesang”, “Canto do Reconhecimento”, de Beethoven, já o fez sentir Deus, na forma como o indicou Aldous Huxley: um "Cortraponto". Foi um orgasmo do amor pela música que começou cedo, ouvindo justamente os grandes mestres. Depois viria o jazz, o spiritual, o blue, o som de Billie Holliday, Louis Armstrong, Ella Fitzgerald. Dai, o gosto desembocou para a música popular, elétrica, tocada pela “juventude que queria sair de casa, conhecer o mundo”.
O grito maior, considera Joanilo da Paula Rego, foi mesmo de Bob Dylan, a gaita-de-boca, o som arrastado, os poemas longos de desagrado por um mundo que não era (é) bom; a canção-balada "Blowin in the Wind", o Hino dos Direito Civis, os Direitos Humanos, grito tão forte do homemhumano que derruba do trono o homem-poder. Dylan, e depois os Beatles, são as duas marcas na história da Música Pop.
A música de Dylan afinava-se com a poesia de Lorca, Neruda (o grito latino-americano) e de Maiakovski. A música andou, o ritmo foi se agilizando e chegaram Elvis Presley, Billie Halley até que... chegou 1966!
A Revolução da Contracultura, a música liderando a cultura de massa (Mas não a imposta pelos meios de comunicação) e por sua vez liderada por unn loucos cabeludos e geniais ingleses: The Beatles, Os Insetos. Tanto incomodaram Os Insetos que, desde a explosão de 66, nada de novo parece ter sido criado na música. "Sargent Peppers" começou a nova face e "com ela a juventude encarnou os grandes problemas do seu tempo". Quase passo a passo com os Beatles, marcharam os Rolling Stones, diz Joanilo, e destes, como dos primeiros, eles têm tudo."
Mas, para alimentar sons quadrifônicos como o seu, Joanilo de Paula Rego aponta os novos músicos que surgiram com os Beatles e mantiveram o POP SOUND depois que eles se separaram: Pink Floyd, Genesis, Who, Queen, Jethro Tull, Frank Zappa, Rick Wakeman, Jimmy Hendrix., Emerson, Lake & Palmer, Eric Clapton, Queen, King Crimson, Frank Zappa, os desmembrados John Lennon e George Harrison, Janis Joplin. Ligado também à música brasileira, ouve - e gosta de Tom Jobim, Egberto Gismonti, Chico, Milton, Noel, Pixinguinha, Ataulfo e Adoniram Barbosa, Vinicius e Hermeto Pascoal.
Dentro de um Karmanghia ouvindo Pínk Floyd ou os Beatles que saem dos oito tweeters, oito altofalantes e um amplificador de 60 watts, "sinto-me viajando à Lua ou dentro do Yellow Submarine, sempre viajando”. Para entender tudo isto, Joanilo exercita apenas seus conhecimentos de inglês, dos aspectos técnicos da música e dos equipamentos sonoros e o gosto pelo som.
MÚSICA E ROCK, O QUE SÃO
Quando define a Música, as palavras de Joanilo evidenciam a influência do Clássico e do Rock. Um dos poucos interessados no fenômeno da música pop no Estado é assim que fala: "No principio era o Som. E o Som se fez carne e habitou entre nós. Diz a Bíblia que no princípio era o Verbo. Antes do Verbo veio o Som, que era a harmonia, o ritmo e o ruído das esferas em movimento, a canção inaudível e intraduzível dos mundos em gestação. O caos animado e o fogo dançante. Algo como Manuel de Falla descreveu na "Dança Ritual do Fogo".
A musica é essa catarse. Esse mergulho no fundo de um poço sem fundo... E depois o retorno à superfície, redivivo e purificado, para a redescoberta do sol e do mar. Ouvir música é a capacidade de ver em pleno dia trezentos milhões de arcanjos em plena Praia do Forte, parodiando Ledo Ivo.
É ver um buquê de canções se derramando sobre o corpo desnudo da amada ausente. A música é uma fuga de nós mesmos e um mergulho nos abismos do ser. É a vertigem dos espaços, a ânsia da paisagem, desmaios nos céus rarefeitos do coração, de la musique avant toutes les choses" (da música antes de todas as coisas).
ROCK
"No princípio foi o grito. Depois o ritmo. Depois o gemido. Grito-gemidoblues, rhythm-countrywester n- rock'n roll =rock. Em torno do grito e dos sistemas sonoros acumulados e sedimentados na estrutura primitiva e na importação européia, se formou o Rock. A célula básica dos blues é o blue note. Ou notas rebeldes. Ou dirty notes, isto é, notas suias.
Os gritos acompanhados pela guitarra, gaita-de-boca, marcados na batida do pé, e depois mesclados com o trombone, corneta, clarineta, piano, órgão e sintetizador. Diálogo entre voz e guitarra é o Rock. Do grito rústico das plantações do Sul, do negro escravo ao branco marginalizado, até as grandes cidades e megalópolis de hoje, está a história do rock. Do grifo ao rock sinfônico.
Mas o rock é para se sentir e curtir, como de resto toda a música. O bom mesmo em música não é definir nem fazer história. É ver-ouvirsentir-curtir."
MÚSICA TEM POLÍTICA, DESCOBRIU
É possível, ao contrário do que pensam Gilberto Gil e Caetano Veloso, pensar-se politicamente a partir da música?
Sim, responde Joanilo de Paula Rego. Para ele, a música, além de "amor, gozo, criação, fecundação", é também um desaguadouro de pensamentos e posições políticas.
A música se liga a ele pela mensagem política. "Fui um animal político não realizado. Minha geração procurou o equilíbrio entre Jesus e Marx, o que não pode realizar. O difícil é o equilíbrio. A música é um refúgio onde imagino meus ideais realizados, meus sonhos de humanidade perfeita". Compara "Blowin in the Wind", de Bob Dylan, com a Marselhesa, o Hino da Revolução Francesa e da França. "Blowin in the Wind" é o hino dos Diriitos Civis."
A partir daí, é mais fácil saber o pensamento político de alguém que não está ligado só à música pop:
RIO GRANDE DO NORTE: Politicamente estagnado. Não se fecundaram novas lideranças.
477: Proibiu o nascimento de lideranças, porque as lideranças nascem nas escolas, porque elas nascem novas e não velhas.
REDEMOCRATIZAÇÃO: É problema histórico, cíclico.
LIBERDADE: Meu gosto pela literatura latinoamericana é o gosto pela liberdade dos jovens e dos velhos que não deixam de ser jovens, entre os quais me incluo e não arredo. A paixão pela liberdade e pelo belo é tão grande que quanto mais os anos passam mais resiste. O latinoamericano em geral tem sede de infinito, idealismo e liberdade comparável ao grito negro da América que deu o goldapel, o spiritual, o rock.
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REGIME: Nem o do burguês sofisticado, de carro importado, nem o hippie das calçadas. Sinto-me marginalizado em meio à burguesia. Os colegas de faculdades não compreendem minha figura. Prefiro não ser entendido pela legião dos bem-comportados, dos quadrados e dos enquadrados.
DINARTE: Trabalhei com Dinarte e procurei trazê-lo a meu pensamento. Uma das maiores figuras do Estado. Adapto para ele o que diz Lorca sobre Inácio Sanchez: "Tardará mucho tiempo en nascer, si es que nesce, un andaluz tán bravo, tán rico de aventuras". Digo: Tardará a nascer um potiguar tão bravo, tão rico de bravura, se é que nascerá. Ele é genial porque, quase analfabeto, chegou ao que queria. Em política é uma figura antiga, no estilo patriarcal dos velhos coronéis. Escreveu-me textualmente quando visitou a Suécia: "Vi o paraíso da Terra, na Suécia: o socialismo sueco". Isso está escrito num cartão postal.
ALUISIO: Tem dados na balança mais positivos do que negativos. No governo, procurou abrir novos horizontes. O ódio esconde um amor frustrado. Aluisio é inteligentíssimo, com gamas de publicitário. Quando usou a publicidade para ele mesmo, usou como ninguém.
TARCÍSIO MAlA: O governador atual vai começar a governar no dia 15 de março de 1979. Até lá não terá construído uma obra, mas terá feito dezenas de inquéritos... Até lá, estou observando, anotando, para ao final escrever a crônica de uma idade, de uma era. Tanto poderá ser a Idade do Ouro (Renascimento) como a Idade do Couro...
POLÍTICO IDEAL: Terá as qualidades de Aluísio, as virtudes de Dinarte e os defeitos de Milton Campos. Para mim, é o símbolo e a síntese ideal do futuro líder potiguar, que vem aí... Mas nascido e batizado no ventre e no amor do povo.
POVO: Teve esgotada sua credulidade. O povo é bom, o povo do Rio Grande do Norte é sensível. As cores foi um pastoril... a transformação do povo em pasto, para pisoteio e comida dos cavaleiros andantes que vieram para um pic-nic, um safari, uma experiência de quatro anos.
Beco da Lama, o maior
do mundo,
tão grande que parece mais uma
rua...
Tal qual muçulmano que visite Meca uma vez na vida, todo natalense deve ir ao Beco libertário, Beco pai das ruas do mundo todo.
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