Ilustração: Assis Marinho
Netuniana
Aroldo Martins
Chantado em muito firme piso, ergue-se, inamovível, nosso fortim, edifício primitivo construído por flibusteiros do rei de além-mar, que aqui aportaram num distante século dezesseis.
Guardião da boca da barra, sobressai-se majestoso, monolítico, bastião inacessível encravado num lajedo submerso, plataforma que se descontinua para logo depois formar o colo do rio.
O velho forte observa assim as cercanias, separado da Redinha pelo estreito canal onde se encontram as negras águas do rio com as alvas espumas do Atlântico.
Por ali, desfilaram belicosos bergantins, astutas caravelas, matreiras escunas, quando em busca de refúgio no povoado inocente.
A vila, ninada pelo balanço das antigas embarcações que a visitavam, transformou-se em cidade gulosa, necessitada.
Navios e vasos de guerra cada vez maiores forçam a entrada da cidade desprotegida e nua.
Desobstruir para que atraquem, palpitam alguns.
E quando inexorável e paulatinamente homens-rãs ovados de explosivos detonarem suas cargas nas pedras e gabiões que cercam o forte e a Redinha, acordarão abantesmas entorpecidos, que, em conluio à luz da lua, conjuram temível castigo.
Da tarde ondulada por sopros de um estranho barlavento, surgirá um tênue crepúsculo de poucas e opacas estrelas.
A noite aparece cansada nas varandas e saletas, logo indo dormir amedrontada.
Na curta madrugada, um poderoso banzeiro avizinha-se num crescendo, subindo as margens, invadindo as ruas.
E quando as fraldas das ondas beijarem anáguas estendidas no teu quintal, Geraldo recolhe a traineira, diz a Dalila para esconder o segredo do pirão batido e da farofa-de-bola e vai, suspenso pelo pé do gavião, com seus olhos de mestre Arrais a descobrir porto seguro!
10 de Julho de 1997
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