domingo, 10 de abril de 2011

O forró de Maria Gorda


Ilustração: Marcelus Bob

Candelária
As meninas do forró eram
comandadas por Maria Gorda, a empregada do padre

Eduardo Alexandre

Quando Candelária ainda não era Candelária, era Pedregal, na rua Princesa Leopoldina tinha um forró daqueles autênticos, tipo de pé-de­serra, chão de barro batido, um quartinho para as moças, e zabumba, triângulo e sanfona para animar as noites de sua gente solitária e cheia de tédio.

O fole fazia a festa dos fins-de-semana dos primeiros moradores e muitos são os que ainda se lembram, com saudade, desses dias da Candelária isolada, sem nada, com ônibus só na Salgado Filho.

- O forró era de Maurício, e a empregada do padre, Maria Gorda, era quem comandava as meninas, diz seu João Augusto Câmara, um octogenário que veio de Jardim de Angicos, Lajes, para habitar uma das primeiras sessenta casas entregues a mutuários.

- Quando chegamos, aqui era tudo mato. As pessoas aproveitavam a madeira, tijolos, todo esse material de construção que sobrou das primeiras casas, para ampliar as suas. Conta a mulher de seu João, Dona Ester, uma professora primária aposentada que, parece, não quer entrar na conversa do marido.

DESMANTELO

Era, segundo seu João, o Forró do Desmantelo, que funcionava com duas lamparinas a gás, iluminando "a dança respeitosa, apesar da bebida dar na canela".

- Sebastião era o dono do quarto. Vinham para as festas Barba de Bode, Boca Rica, Raimundo de Lajes, Antônio Doido, muita gente que ainda hoje continua morando por aqui. Maria Gorda trazia as meninas e a festa começava. Ester não sabia de nada. O forró durou pouco, mas, enquanto funcionou, foi bom.

Veio o processo rápido de urbanização, os moradores foram chegando, o Forró do Desmantelo terminou cedendo ao progresso do bairro. Lamenta, saudoso, seu João.

ESPAÇO CULTURAL

Hoje, as adjacências da Candelária têm um dos mais importantes espaços culturais da cidade, o Espaço de Natal, o conhecido Papódromo, sem qualquer utilização para os fins a que estava destinado após a vinda de João Paulo II.

Em vez de servir a cultura, o local serve à burocracia estatal, não passando de repartição pública. Um local ideal para grandes espetáculos, quermesses, festas juninas. Um espaço cultural que poderia ser utilizado para as grandes festas da cidade e do bairro, mas que não é utilizado.

Um elefante branco sem serventia para a comunidade que reclama por opções para o lazer e o saber de sua juventude.

Se o forró de Pedregal dá saudades a seu João, Maria Gorda, a Antônio Doido, que saudades o Espaço de Natal não estaria deixando à juventude do bairro e da cidade se realmente fosse utilizado para fins culturais?

Fevereiro, 2000

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