sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
Rosário de Violência
Uma pedra no rosário da violência cotidiana
Plínio Sanderson
Fatídico: a cidade deu as costas ao rio que lhe deu como nome, Grande do Norte. Entre lusco-fusco e perpétuos movimentos das marés, só resta os dejetos, inclusive, alguns próprios humanos. Contradizendo lendas, incrustadas nas estórias ribeirinhas quase esquecidas, onde outrora, nadava Cascudo por linhas fluvialmente sinuosas.
Se ninguém sabe ao certo quem fundou Natal, há polêmica também quanto aos dizeres ungidos na santa, que aqui aportou alheia ao futuro incerto da freguesia daquela zona marginal, entre a canguleira Ribeira e a cidade xaria.
Na tradição oral, dois sabedores da história paroquial, profº Panqueca (filho do primeiro poeta da terrinha, Lourival Açucena) e Chico Bilro, diziam que a padroeira chegara em datas diferentes (1753 ou 1736?) e afirmavam versões discrepantes: “No ponto onde der este caixão não haverá nenhum perigo” (Panqueca). “Onde essa santa parar nenhuma desgraça acontecerá “(Bilro). Ingênuos, não vislumbraram a usura intrínseca e a agonizante enfermidade da alma humana.
Antes, feira e entreposto comercial. “Cedo era visitada por gente séria e alta... depois ficava movimentada, mais sedutora, mais perigosa, cheiro confuso, luzes vermelhas, alegria, rumor, pertubação, feira do Passo”.
Nos confins dos tempos atuais, espremida entre a urbe impiedosa e o manguezal do tédio, resiste uma comunidade que assolada, teima sobreviver na selva da pedra. Droga efêmera que destrói famílias e demole lares. Desconstrução de pedra sobre pedra, (des)equilibradas entre trilhos que levam a caminhos sem chegadas ou volta nenhuma. Insolente, a Santa aponta o caminho (nada bíblico) das pedras, desembocando no âmago existencial ou nos descompassos de pobres criaturas guabirus.
Vem à tona, pertinentes problematizações:
A maioridade aos dezesseis anos... Quando se permite que adolescentes votem o destino de todos, por que não assumirem seus próprios atos? É questão conceitual, a cidadania pressupõe direitos e deveres iguais, é a clássica noção de isonomia da polis grega. A impunidade das leis, faculta a desmoralização das mesmas. A coercitividade é inerente a todo fato social diz Durkheim.
Outra ponderação cabível é a inércia do estado, dentre todas suas características, a mais contundente é o monopólio da violência através de seus aparatos militares (polícias, forças armadas). Quando esse monopólio da violência é confrontado por traficantes, milícias, grupos paramilitares, e esses ameaçam o fim desse monopólio, o estado entra em colapso, começa a deperecer e mergulhar na mais sombria barbárie.
Lentes quaisquer já não conseguem desenhar silhuetas de luz no humano, nem focar nesse breu insólito, o contorno de gente, que como num flash mágico eclodiu para brilhar e não pra morrer ou matar tão bestialmente.
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