domingo, 20 de setembro de 2009

... Ma belle

Ma belle, mais versos perdidos na alma do papel que já se desbota na gaveta. Medi os sons, montando sílaba a sílaba com o auxílio dos dedos. Mutilei a liberdade poética sem o menor pudor para vesti-las com um poema nobre, metódico e alexandrino com o qual batizaram a musa que não sabe que é musa nem se enxerga nos desconformes da inspiração.

Inspiração inútil. Isso porque me faltam forças para trazê-la à luz da verdade. Inverdade? Invejo as pessoas de saliva fácil que acreditam nas forças ocultas do veneno da idéia em estado de graça. Incluo-me entre os tímidos incapazes de conquistar a sorte de ser mortalmente atingido por um beijo marginal. Idiota encurralado pela sombra da catástrofe.

Catástrofe é o estado sobrenatural do meu peito. Como peito? Cafona falar de peito. Como você? Como! Certamente igual. Como você, carrego dezenas de anjos que atiçam a chama do meu inferno particular, caçoando de mim com aqueles olhares, com aquelas bocas, com aqueles sei lá o quê não sei das quantas, caçoando de mim e dos outros homens.

Homens desesperados por lirismo. Habitar os pensamentos do lirismo seria pedir demais? Horror! Hoje não há espaço. Haverá de ser no futuro, haverá de ser talvez o destino deste corpo largo que me sustenta nos rastros do apocalipse da carne, harmonizado no cheiro das ilusões jogadas entre o que se vê e o que é verdade de verdade na rua da espera.

Espera é calvário de esperança, esperança é infância de espírito, espírito que me invade por enquanto, enquanto não me canso dos espasmos, espasmos travestidos de espadas, espadas sanguinárias de outras eras, eras registradas entre as vértebras da espinha, espinha por onde sobe um frio em espiral, espiral de silêncio que atiça o gelo ardente da loucura.

Loucura de alcançar a clemência de seus beijos, lançando-me do cume do devaneio que criei só para você. Levemente embriagado das Iluminações do abismo de Rimbaud, levo horas “à espera de ser um louco muito perigoso”, lá nos domingos em que “crianças sufocam maldições nas margens dos rios” em cujos leitos habitam fantasmas de luxúria.

Luxúria irmã de minha alma assujeitada por desígnios do pecado. Louvada seja a doçura do pecado! Louvado seja o seu nome que enseja tais desvios aos meus olhos e à minha boca. Leia neles e nela o seu nome se for capaz. Lapidei cada letra numa nuvem diferente com a cor da voz da ventania. Leves nuvens interligadas nos espasmos dos eclipses.

Eclipses formados entre lampejos de farol nublam a vista dos sobreviventes da Catarineta, escurecendo as veredas das marés enquanto mais distante da salvação e mais próximo do inferno o espectro de mim entoa canções de amor e de guerra no silêncio sepulcral dos campos de batalha, espelhos sanguinários dos demônios inventores da paixão.

Cid Augusto

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