terça-feira, 29 de setembro de 2009

Canto do Potiguara

Lourival Açucena

(TORÉ)

Curupira se afugenta,
Manitó esquece a taba,
Mas minh´alma não esquece
O amor de Porangaba.

Cai a murta, o camboim
O murici, a mangaba,
Mas não cai dos meus sentidos
O amor de Porangaba.

Cambaleia o pau-d´arqueiro,
Que ao rijo tufão desaba:
Mas não se abate em meu peito
O amor de Porangaba.

Vai-se o torcaz que gemia
Ao pé da jabuticaba,
Mas não deixam os meus anelos
O amor de Porangaba.

Foge a abelha que zumbia
Sobre a flor da guabiraba,
Mas não foge aos meus afetos
O amor de Porangaba.

Despe a flor o ingazeiro,
A oiticica, a quixaba:
Mas não me escapa da mente
O amor de Porangaba.

Da cunhã remorde a face
Reimoso capiucaba;
Mas não remorde o ciúme
O amor de Porangaba.

De Moema o terno amor,
Não, não rende o imbuaba,
Mas a mim rende e cativa
O amor de Porangaba.

Da extremosa Margarida
O amor já não se gaba;
Mas eu decanto, Arãhi,
O amor de Porangaba.

O pajé canta a bravura
Do alto Morubixaba,
Mas eu só canto em toré
O amor de Porangaba.

Anhangá cede a Tupã
No poder que não se acaba,
Mas não cede a outro amor
O amor de Porangaba.

Explicação do Canto do Potiguara

Potiguara: “Comedor de camarão”, nome da tribo que habitava o Rio Grande do Norte.
Toré: Melopéia indígena. Canto tristonho, prolongando os últimos versos.
Curupira: Gênio do Mal.
Manitó: Gênio protetor da
Taba: Casa grande ou o ajuntamento das habitações indígenas.
Camboim: fruto silvestre do Brasil.
Muricy ou murici: Gênero de plantas malpighiáceas do Brasil.
Pau-d`arqueiro: Nome popular de pau-d`arco.
Torquaz, ou ainda concliz ou corrupião: Nome de ave do Brasil, famosa pelo canto e pelas cores.
Jabuticaba: Fruto da jabuticabeira, mirtácea do Brasil, que compreende várias espécies.
Guabiraba: Fruto da guabirabeira, gênero de borragináceas do Brasil.
Quixaba: Fruto silvestre do Brasil.
Cunhã: Donzela.
Capiucaba: Marimbondo.
Moema: Personagem histórica dos primeiros tempos da colonização no Brasil.
Imbuaba: Nome dado pelos indígenas ao europeu; do guarani – neboab, “pernas vestidas”.
Arãhy: Interjeição ou explosão de voz (em Tupi) traduzindo a saudade.
Pajé: Feiticeiro e cantor dos feitos guerreiros da tribo.
Morubixaba: Chefe dos índios. Maioral.
Anhangá: O Diabo dos índios.
Tupã: Deus

In Joaquim Eduvirges de Mello Açucena (Lourival Açucena) (Lorênio)
Versos reunidos por – Luís da Câmara Cascudo,
Coleção Resgate – Editora Universitária UFRN, 1986.

1. Defronte à Igreja Matriz de Nossa Senhora da Apresentação, onde hoje se situa a praça André de Albuquerque.
². Atual avenida Rio Branco, Cidade Alta.
³. Atual rua Chile, na Ribeira.

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