Jornal de WM
por Woden Madruga
Palumbo
Peguei os “feriados” para ler o último número da revista Palumbo. Traz uma entrevista com o jornalista Jomar Morais, que está em qualquer seleção que se fizer da melhor imprensa brasileira nestes últimos trintanos, hoje aposentado, vivendo em Natal, e dedicando tempo integral às suas pesquisas e reflexões espirituais.
Outro texto que me chamou a atenção é o artigo de Eduardo Alexandre Garcia, “Palumbo? Por Justiça, Plano Jeremias”, que desmistifica essa história de chamar os bairros de Petrópolis e Tirol como “Plano Palumbo”. Tudo isso começou com uma fantasia de nossa Abelinha que foi na onda de um zangão dado a lendas e fábulas.
A verdade, como se sabe, é que Palumbo não botou um meio-fio nem no Tirol e nem em Petrópolis, que já existiam há muito tempo antes dele aportar em Natal, final dos anos vinte, convidado pelo prefeito Omar O’Grady. Na verdade, na verdade, dos desenhos de Palumbo só ficou mesmo o alargamento da Duque de Caxias, na velha Ribeira. Mas isso é outra história.
A imprensa natalense, muitas vezes por desinformação e a falta de uma leitura mais qualificada, reinventa a história da Cidade, embaralha fatos e pessoas, cria uma “Praça Cívica”, uma “Praça das Flores”, um “Largo do Teatro”, uma “Praia do Centro” (Imagine uma praia no Grande Ponto, na Cidade Alta!), muda os nomes das ruas e avenidas tradicionais, mistura os bairros, cria “prolongamentos” de avenidas, faz paródias e coisas que tais. Plano Palumbo é uma delas.
Gostei do artigo de Eduardo Alexandre. Pena que ele não tenha citado o mestre Luis da Câmara Cascudo Em sua História da Cidade do Natal, Cascudo conta tim-tim-por-tim-tim como surgiram os bairros de Petrópolis e Tirol nos descampados da Cidade Nova. Transcreve, inclusive, uma carta do governador Alberto Maranhão, irmão de Pedro Velho, onde tudo começou, e onde tudo esta contado.
Também teria citado o livro do arquiteto e urbanista João Mauricio de Souza, Evolução Urbana de Natal em 400 anos.
Eu, se fosse Afonso Laurentino, mudaria o nome da revista.
O artigo
Palumbo? Por justiça, Plano Jeremias
No início dos 1900's, com 13 mil habitantes, Natal era cidade tão pequena que os que a visitavam gracejavam: "Natal? Não há tal!"
Vindo da esquerda da lagoa de Manoel Felipe, o riacho Tissuru ganhava águas sobradas desta e seguia rumo à cruz do Baldo, Bica, dando de beber à povoação que dormitava à direita, em claros habitada até o topo da duna, Cidade Alta, e seguia descendo, até proximidades da feira da Tatajubeira, na campina da Ribeira, adjacências do porto novo, esplanada que começava a trazer desenvolvimento para a pequena capital.
Porto, terminal ferroviário da Great Western, sede de governo na rua do Commercio, depois Chile, a Ribeira dava cartas do progresso lento que a cidade vivia.
Quase esquecidos, estavam os tempos de grande movimentação comercial do porto de Guarapes, que quase leva para Carnaubinha, margem esquerda do Jundiaí, a honra de sediar o governo provincial nos idos 1860's, quando Fabrício Pedrosa ali inaugurou feira, construiu porto, palacete para sua residência, escola, armazéns, abrigo para escravos, comandou a economia do Rio Grande do Norte e mudou o nome de Coité para Macaíba.
Vem de Guarapes e da gente que viria de Fabrício Pedrosa, a insatisfação de Natal ser, neste início dos 1900's, tão pequena, limite leste da Cidade do Alto fincado no sítio Cucuí, à direita da Ulisses Caldas, e palacete inacabado do juiz federal, doutor Porfírio Santos, depois vendido e reformado em 1906 para sediar o Colégio Imaculada Conceição, à esquerda de quem vinha do Rosário para a tétrica e temida, mas divertida zona meretrícia do Vem-quem-quer, rua Mossoró, caminho de vivendas, sítios, quintas e granjas antes dos morros. Casebres, choupanas, morro do Estrondo a espalhar medos e lendas em trilhas a ele levadas.
Depois de ganhar porto e terminal ferroviário, a Ribeira queria aterro para ver-se livre das águas do braço de rio que avançava até beiradas das dunas que levavam ao sítio do Jacob, tapera erguida no alto do Belo Monte, visão do Atlântico descortinando-se ribas abaixo.
Era naquela área, descendo o Belo Monte e se expandindo até as proximidades da lagoa de Manoel Felipe, que o primeiro governador republicano do RN, Pedro Velho, sonhava dar à cidade o seu terceiro bairro: a Cidade Nova.
Prefeitura chamava-se Intendência. Tinha presidente. Pedro Velho era filho de Amaro Barreto, o homem que seguiu os caminhos do cemitério do Alecrim, fincou direção de estrada no Alto da Bandeira, levando-a até o entreposto de Guarapes, onde estava fixado o grande comércio.
Em 1901, era intendente de Natal o presidente Joaquim Manoel Teixeira de Moura, chamado Quincas Moura. Foi ele o responsável por fazer realidade o sonho de Pedro Velho, ao criar, através da Resolução 55, de 30 de dezembro, o sonhado terceiro bairro de Natal.
Por quatrocentos mil réis, Quincas Moura contratou Jeremias Pinheiro da Câmara e este demarcou as avenidas e ruas que viriam a compor o novo bairro.
Terra barata, sem valor comercial, as casinholas que interrompiam a abertura enxadrezada dessas avenidas e ruas projetadas foram compradas ou desapropriadas pela Intendência a preço vil, o que constrangeu cerca de 300 moradores e elevou vozes oposicionistas, que deram ao bairro projetado o nome de Cidade das Lágrimas: oito avenidas de 30 metros de largura, paralelas, que receberiam nomes de presidentes da República; seis ruas transversais, também paralelas, que receberiam nomes de rios norte-riograndenses e; duas praças, a Pedro Velho, que ia da Deodoro à Prudente de Morais, e a Municipal, depois Pio X, onde hoje se encontra a Catedral Metropolitana.
Como até então só haviam governado o Brasil seis presidentes, as duas últimas avenidas projetadas se chamaram provisoriamente avenida 7 e avenida 8, respectivamente, hoje, avenidas Afonso Pena e Hermes da Fonseca.
O Master Plan da Cidade Nova, como foi chamado, foi concluído em 1904 pelos engenheiro Antônio Gondim e agrimensor italiano Antônio Polidrelli, contratados em julho de 1903, contando 60 quarteirões. Casas com terrenos de 30 metros de frente, separadas umas das outras por, pelo menos, 5 metros de distância.
A maior das avenidas era a avenida 8. Tinha 5.261 metros de extensão. Ia até onde hoje está o Midway Mall, cruzando a avenida 15, que vinha do Alecrim, Bernardo Vieira depois e limite da cidade, posto fiscal, "corrente".
A Cidade Nova foi dividida em dois bairros: Petrópolis, em homenagem à cidade fluminense e; Tirol, província austríaca, cantão suiço.
Petrópolis desenvolveu-se em torno do Monte Belo, Belmonte, Monte Petrópolis depois, trilhos descendo bonde aos pescadores de Areia Preta já em 1913; subindo Caminhos da Saúde, tapera do Jacob tansformada em residência do governador Alberto Maranhão, edificação que em 1909 se transforma em Hospital Juvino Barreto, sogro do construtor do Teatro Carlos Gomes, alagado da Ribeira aterrado, porém ainda não vencido.
Ao pé do Belo Monte, homenagem ao presidente da Intendência, a rua Joaquim Manoel levava à Ribeira e, no outro extremo, encontrava a avenida 8, em curva que levava ao sul, onde, cansado de deitar vistas sobre o mar, Joaquim Manoel ergue Senegal, hoje sede do Distrito Naval, vivenda defronte à Solidão, de Pedro Velho, que seria Escola Doméstica de Natal. Ainda insatisfeito, o intendente Quincas Moura edifica nova residência onde viria a ser o 16 BIM. Defronte, mais um empreendimento de Alberto Maranhão, casa com piscina e poço tubular, depois transformada em Aéro Clube.
É esta a área que hoje querem chamar Plano Palumbo. Um erro.
Giacomo Palumbo, arquiteto italiano, só aparece na história de Natal em 1929.
Contratado pelo prefeito Omar O'Grady, ele elabora o Plano Geral de Sistematização de Natal, que "articula o zoneamento da cidade (definição e distribuição das funções administrativas, comerciais, Industriais, etc.), com o embelezamento (agenciamento de ruas e avenidas, arborização, passeios, parques, etc.) com a infra-estrutura (sistema viário, iluminação, etc.) e com medidas ambientais e de higiene, como a criação de um grande parque central, e a localização adequada de cemitérios e matadouros."
Ao que querem chamar Plano Palumbo a área mais nobre de Tirol e Petrópolis, observados critérios técnicos, por justiça, deveriam chamar Plano Jeremias, o dos primeiros contornos, ou, quando muito, Plano Polidrelli, que a partir de 1903 sequenciou os traçados dos novos bairros de Natal e, ao que parece, também enxadrezou planejamento para avenidas e ruas do Alecrim, dando-lhes numeração como fizera à avenida 8, hoje a importantíssima avenida Hermes da Fonseca, a que, na II Guerra, recebeu asfalto para transportar soldados, mantimentos, máquinas, combustíveis e armas entre Natal e o campo de pouso aéreo aliado instalado no Rio Grande do Norte, o Parnamirim Field, caminhos do sul, hoje rodovia de entrada da cidade, braço de Br.
Por critérios políticos, Plano Governador Pedro Velho, Plano Governador Alberto Maranhão ou Plano Intendente Joaquim Manoel.
Plano Palumbo, jamais.
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