O Jornal de Hoje
18 NOV
1918 - A gripe espanhola em Natal
empresário, escritor e presidente da Fundação Amigos da Ribeira (elisio@mercomix.
No ano de 1918, Natal era uma cidade tranquila, que acompanhava nos jornais as notícias da terrível guerra que se desenrolava há quatro anos.
Diariamente, os jornais locais traziam notícias dos combates e histórias acerca das novas armas, como o avião e o submarino. Aqui, embora o natalense acompanhasse o conflito distante, o ritmo da cidade não era alterado.
Porém, em 26 de outubro de 1917, depois de quatro navios brasileiros serem torpedeados por submarinos alemães, o Brasil declarou guerra. Todo o País sentia-se orgulhoso de participar da 1ª Guerra Mundial e o Presidente Wenceslau Brás decidiu comprar uma frota de navios para a Marinha de Guerra, no intuito de ajudar os Aliados.
Em maio de 1918, partiu da Capital Federal a pomposa frota naval, que foi batizada de DNOG (Divisão Naval de Operações de Guerra). No mês de julho, a frota composta de oito navios aporta no Rio Potengi, encantando toda a Cidade de quase 29.000 habitantes. Após a partida da DNOG em direção à África, a cidade voltou ao ritmo normal.
No dia 24 de setembro de 1918, o jornal "A República" publica em sua edição de terça-feira uma nota intitulada "Influenza", que notificava que o ministro do exterior Nilo Peçanha havia sido comunicado de que vários marinheiros da DNOG morreram em consequência da "influenza ou gripe espanhola". Logo depois, com a chegada de novas informações, ficava claro que uma epidemia estava crescendo mundo afora, tornando-se o que a ciência classifica de pandemia, ou seja, uma doença em escala global. No Rio de Janeiro, ainda na segunda quinzena de setembro de 1918, vários navios comerciais chegaram com passageiros infectados e começaram as primeiras mortes no País.
No dia 3 de setembro do mesmo ano, o jornal "A República" informava que havia diversos casos da influenza no Recife, e, a partir daí, a notícia passou a ser constante nos jornais de nossa Capital.
Conforme o medo da doença crescia, várias medidas de higiene pública começaram a ser postas em prática.
No dia 23 de outubro de 1918, o Colégio da Conceição resolveu encerrar o ano letivo sem festas, nem entrega de diplomas, com medo da epidemia. Várias medidas profiláticas surgiam por toda a cidade, com o intuito de evitar a doença: "evitar aglomerações, não fazer visitas, evitar fadiga e excesso físico".
O interior também não se mostrava imune à influenza. Da cidade de Areia Branca vinha a notícia de que a gripe havia chegado à cidade.
De Nova Cruz, o Presidente da Intendência informava que se recuperava da gripe espanhola. O Intendente de Mossoró informava que 38 pessoas haviam morrido na cidade.
De uma hora para outra, a gripe espanhola entrou no cotidiano da população da Capital, e começam a surgir nas páginas dos jornais anúncios de diversos remédios, tais como: "puritol", "bálsamo philantropico", "kolyohimbina", "briônia", que prometiam a cura contra a gripe espanhola.
Provavelmente, a primeira morte ocorrida em Natal em decorrência da gripe espanhola foi a do comerciante cearense Mozart Barroso, a bordo do navio "Pará", que estava ancorado no porto da cidade. Segundo a edição de 15 de outubro da "A República", a morte teria ocorrido devido a uma "moléstia" que o cidadão contraíra durante a viagem. Contudo, não se sabe ao certo se Mozart Barroso morreu ou não de gripe espanhola, pois a imprensa não esclareceu.
O fato é que, quatro dias depois, o respeitável médico Dr. Januário Cicco escreve em "A República" uma coluna, visando auxiliar na defesa da saúde pública contra a epidemia de gripe ou influenza espanhola.
O Dr. Januário recomendava o uso de "quinina", tendo distribuído comprimidos nas farmácias da cidade. Enquanto isso, chegavam notícias de que no Rio de Janeiro em 19 de outubro fora decretado um feriado de cinco dias, na tentativa de se evitar aglomerações e o pânico entre a população.
Em 21 de outubro de 1918, morreu o primeiro doente na cidade de São Paulo. Até dezembro desse ano, somente na Capital Federal morreram entre 12.000 e 17.000 pessoas, e entre 5.400 e 12.300 em São Paulo.
Em Natal, apesar da assistência oferecida, o número de mortos crescia e surgiam notas discretas nos jornais.
Eram atendidos em média 350 pessoas por dia, e os escoteiros percorriam as ruas do Alecrim, entregando remédios à população carente, que não tinha condições de se dirigir ao Colégio "Frei Miguelinho".
Nos necrotérios dos mais abastados não existia a mínima referência de que a causa da morte tivesse relação com a gripe espanhola.
Em 1 de novembro de 1918, o governador Ferreira Chaves, em mensagem ao Congresso Legislativo do Estado, deixou claro que a gripe espanhola deixara marcas em todas as camadas sociais de Natal, mesmo não tendo sido tão mortífera. Finalmente, em dezembro de 1918, da mesma maneira que chegou, ela deixou nossa terra, e a Inspetoria de Higiene considerou extinto o surto em nosso Estado.